02 julho 2019

A deusa do frio: Cailleach!


A deusa do frio: Cailleach!

Cailleach, também conhecida como Cailleach Bheur, ou Buí é uma figura mitológica que aparece na Irlanda, Escócia e na Ilha de Man, sob o nome de Caillagh-ny-Faashag.
Na mitologia irlandesa, é descrita como sendo uma mulher muito velha e lamentosa pela sua velhice. Na Escócia, ela personifica o espírito do inverno, aprisionando a deusa Bríde em sua montanha no final do outono, anunciando o início do seu reinado. Junto com suas serventes, montadas em cabras pretas - as Cailleachan, Cailleach é a responsável pelas tempestades. Na Ilha de Man, foi conhecida como "A Velha dos Feitiços", e possivelmente está relacionada com a feitiçaria
Etimologia
A palavra Cailleach significa "a mãe anciã" ou "a velha" no gaélico moderno, e provém do irlandês antigo caillech ("véu"), que provavelmente tenha a mesma origem que o latim pallium ("pálio", "capa"). Este termo passou para a língua gaélica durante as invasões romanas ao território celta; ao adaptar a palavra à dicção celta, o "p" mudou para "c", e a terminação foi substituída por –ach, que neste idioma servia para marcar adjetivos qualificativos. Com a raiz latina pallium e o morfema celta -ach, o significado literal de Cailleach seria "a velha com véu", "a anciã que está de véu". Este vocábulo é por vezes usado como sinônimo de bruxa na Irlanda e na Escócia.
Enquanto a Bheur, a sua origem é desconhecida. Berry, uma das suas variantes, significa "baga" em inglês. Adicionalmente, acredita-se que deste vocábulo derive o nome da península de Beara, possível local de origem desta deusa. Em resume, o significado completo do nome Cailleach Bheur, em todas as suas variantes, poderia ser "a anciã com véu que habita em Beara". Outro possível significado desta palavra em gaélico é "amarelo", cor considerada nesta mitologia como a da morte e da putrefação.
Aparência física e características
A deusa Cailleach era representada usualmente como uma anciã de pele azulada, um só olho no centro da testa que lhe dava certo parecido com o Ciclope Polifemo, dentadura de urso e colmilhos de javali. Era representada com vestimenta cinzenta, com um avental e com uma espécie de xale ou de capa de tela escocesa nos ombros; e portando às costas uma aljava com flechas de ouro e um arco de madeira de sabugueiro para atacar a quem matasse lobos, javalis e cervos, animais que defendia. Pelo contrário, segundo outra versão, ajudava os caçadores a localizarem esses animais, indicando-lhes onde e quando lançar as flechas. Outras lendas falam da sua varinha mágica, feita de madeira de azevinho, que usava para murchar as folhas no início do Outono e para se converter finalmente em pedra no fim do Inverno. Segundo outras fontes, a varinha era feita com pele humana e na sua saia havia rochas que iam caindo quando avançava. Outra lenda afirma que uma longa caminhada da Cailleach teria originado todos os vales, montanhas e lagos. Adicionalmente, no Inverno, segundo outras tradições, ia montada num grande lobo voador, distribuindo o frio em todas as regiões.
A crença mais estendida entre os celtas da Grã-Bretanha era que, na realidade, Cailleach, a velha feiticeira protetora, era a mesma pessoa que a deusa do fogo, da poesia e da Primavera, Brígida (deusa)|Brígida. No final da estação invernal, a primeira, segundo as lendas dos gauleses, tornava-se voluntariamente numa rocha de grande tamanho, situada junto a um azevinho, local no que não cresce a erva pelo desgosto que a esta lhe provoca. Contudo, segundo outras lendas celtas, viaja em 31 de janeiro para a ilha de Avalon, onde fica a "árvore da juventude eterna", da qual comia para se tornar nova e atraente, transformando-se assim em Brígida. Assim, podia acudir à celebração do Imbolc, um ritual celta no início da Primavera, para que a terra reverdecesse. Outra versão da mesma história sustém que na realidade, a Cailleach mantém prisioneira a Brígida todos os anos para a libertar em Imbolc, o seu ritual sagrado. Também pode ser liberta por Angus McOg, uma divindade celta do amor que se mantém sempre jovem.
Outra crença dos celtas sobre esta deusa é que "nasce" velha no início do Inverno e depois vai rejuvenescendo sem se converter em pedra nem viajar até Avalon, mas pela autoria de um processo natural. Esta tradição estava difundida, sobretudo, em Gales e na Inglaterra. Cailleach também prediz o clima, protege os druidas e transforma-se em grou para salvar grandes distâncias. A Rainha do Inverno, título que lhe adjudicavam os celtas, buscava guerreiros e heróis nas florestas pedindo amor, e quando o recebia transformava-se numa formosa mulher jovem. Quando o seu esposo falecia, repetia a mesma operação. Tinha pelo menos cinquenta filhos, entre os quais havia povos e raças na íntegra.
Atribuições: Deusa do inverno, da proteção dos animais, da sabedoria
Símbolo: Pedras, montanhas, desfiladeiros, gatos, coelhos
Local: Irlanda, Escócia e Inglaterra
Ilustração representando Cailleach
A Deusa Cailleach (pronuncia-se cai-lâk) é uma das mais antigas divindades associadas com a cultura Celta, sendo talvez a mais antiga que se tenha conhecimento na Irlanda. Não é possível saber como ela era venerada ou por quem, uma vez que os Celtas chegaram àquelas terras por volta de 2000 anos atrás, levando seu próprio panteão de Deuses e Deusas e reconheceram Cailleach como antiga, já naquela época.
Ela é muito poderosa e importante pois não desapareceu como outras incontáveis divindades, significando que seu poder ainda está presente nas terras que uma vez foram dedicadas à ela.
Seu nome, em tradução livre do irlandês e do escocês significa “bruxa” ou “mulher velha” e do Galês significa “aquela que usa um véu” e ela é conhecida por possuir enorme sabedoria, por proteger e vigiar toda vida selvagem (assim como Ártemis) e por punir os caçadores que matavam fêmeas grávidas, estrangulando-os com seu cabelo, portanto também responsável pelo fim da vida.
Algumas lendas a associam também com Brigid e suas bênçãos à agricultura e fertilidade da terra, apesar de sua aparência ser muito diferente. Contam que Cailleach é uma idosa de pele negra-azulada com somente um olho na testa que demonstra intensa paixão. Seus dentes são vermelhos e o cabelo é branco como a neve que cobre o topo das montanhas. Em sua mão direita ela possui uma varinha ou martelo que usa para transformar a grama em gelo durante o inverno e também responsável por construir montanhas e desfiladeiros. Diversos lugares na Irlanda e na Escócia são associados à Cailleach, como Cean Caillí (Cabeça de Bruxa) na Irlanda, Sliabh na Caillí (Montanha da Bruxa) também na Irlanda e Ben Cruachan na Escócia. Na primavera ela não conseguia suportar o sol, então jogava a sua varinha à sombra de uma árvore sagrada e transformava-se em uma pedra cinza para esperar o próximo outono, quando retornava à sua forma original.
Deusa da renovação
Cailleach é tão antiga que um de seus poucos mitos contam que ela criou a terra jogando pedras de seu vestido. Ela está sempre conectada à terra similarmente à Gaia, podendo também ser considerada como o próprio ciclo da vida, trazendo o inverno para destruir e renovar.
Na Wicca podemos associá-la com a Face oculta da Deusa, pois ao mesmo tempo que ela destrói, deixa a terra preparada para o renascimento.
Por ser a Deusa relacionada com o Inverno e com recomeços, Cailleach está intimamente ligada ao Sabbat Samhain e é justamente nesta noite que ela acorda de seu sono e volta a caminhar livre pelas terras.
Invocando Cailleach
Reconhecer Cailleach pode ser um passo para reconhecermos nosso próprio potencial. Para isso devemos destruir a concepção que temos de nós mesmos para que assim possamos nos renovar.
Itens necessários:
Pedras
Tecido vermelho
Maçã verde
Espelho
Papel e caneta
Alimentos que goste (o mais natural possível)
Colete uma variedade de pedras para decorar seu altar. Uma boa maneira de fazer isso é sair para dar um passeio em um bosque, praia ou uma área rural. Sinta os cheiros, escute os barulhos, aprecie a natureza ao seu redor enquanto faz o passeio. Não pegue qualquer pedra que encontrar, deixe essa seleção ser um canal com o qual a Deusa conversa com o seu “eu” mais interior.
De volta ao seu altar, abra um círculo e coloque as pedras na disposição que achar melhor. Corte a maçã verde ao meio e coloque-a em cima do tecido vermelho. Invoque os elementos como normalmente faria e encare-se no espelho. Pergunte a si mesmo(a): quais qualidades você identifica no reflexo? Inteligência? Curiosidade? Serenidade? Anote-as em um papel.
Mantenha esses pensamentos em silêncio.
Comece então a apreciar a pessoa que você é e se tornará futuramente, apreciando as qualidades que escreveu e fortificando-as no dia a dia. Procure mudar os traços que não gosta, persistindo nessa renovação e procurando sempre sua felicidade.
Feche o círculo e invoque Cailleach, agradecendo-a pela força que te deu.
Celebre após com alimentos que goste, sucos de frutas, queijo e a própria maçã verde que cortou…
Celebrações nos lembram que o melhor da vida é um tempo de refinamento, bom gosto e grande poder
Texto de ou postado por Naelyan Wyvem e comentado por Sergio Avera, que comentou o texto em vermelho.
Cailleach fala:
Meus ossos são frios, meu sangue é ralo.
Eu busco o que é meu. O busco o que ainda não foi semeado. Eu busco os animais para cavernas quentes e mando meus pássaros para o sul. Eu ponho meus ursos para dormir e mudo o pelo de meus gatos e cães para algo mais quente. Meus lobos me guiam, seu uivo anuncia minha chegada. Os cães, lobos e raposas cantam a canção da noite, a serenata da Anciã, a minha canção.
Eu disse sim à vida e agora digo sim à Morte. E serei a primeira a ir para o outro lado.
Eu trago o frio e a morte, sim, pois este é meu legado. Eu trouxe a colheita e se você não colheu suas maçãs eu as cobrirei de gelo. Após o Samhain, tudo o que fica nos campos me pertence.
Cailleach é a própria terra. Ela é as rochas cobertas de musgo e o pico das montanhas. Ela é a terra coberta de gelo e neve. Ela é a mais antiga ancestral, velada pela passagem do tempo. Ela é a Deusa da Morte, que deixa morrer tudo o que não é mais necessário. Mas é tb ela quem encontra as sementes da próxima estação. (Eis a característica principal de todas as Deusas Negras: vida e morte em um só pacote) Ela é a guardiã da semente, a protetora da força vital essencial ao ressurgimento da vida após o inverno. Ela guarda a própria essência do poder da vida. Ela é o poder essencial da Terra. Nos mitos Celtas Ela representa a Soberania sobre a terra e um rei só podia reinar após realizar o casamento sagrado com Ela, que representa o Espírito da terra.
Cailleach é uma das maiores e mais antigas Deusas da humanidade. Ela é um aspecto da Deusa como a Anciã, principalmente na Escócia. Um derivativo de seu nome, Caledonia, foi dado àquele país. Seu nome, assim como seu título de Mãe Negra, é muito próximo ao nome Kalika, um dos títulos de Kali. (Pensamos em Kali e eis ela aqui tb) Alguns estudiosos acreditam que ambas sejam derivadas de uma Deusa ainda mais antiga, talvez uma das primeiras expressões da face negra da Deusa já cultuadas pela humanidade. Ela foi e é conhecida por inúmeros nomes: Cailleach Bheur or Carlin, na Escócia; Cally Berry ou Cailleach Beara, na Irlanda; Cailleah ny Groamch, na ilha de Man; Black Annis, na Bretanha e Digne, no país de Gales, todas equivalentes a Kali.
Cailleach também é considerada uma outra forma das Deusas Scathach e Skadi. Na Irlanda ela era conhecida como uma divindade que podia trazer e curar doenças (Importante saber que quem traz a doença traz a cura. A sombra é a doença e a cura), principalmente de crianças. O nome Caillech significa mulher velha, bruxa ou mulher velada. Sua imagem velada a relaciona com os mistérios de se conhecer o futuro, particularmente a hora da morte de cada um. Nas lendas Medievais ela era a Rainha Negra do Paraíso, aquela a quem os espanhóis chamavam de Califia; a palavra Califórnia vem deste nome.
Cailleach rege o céu, a terra, o Sol e a Lua, o tempo e as estações. Ela criava as montanhas com as pedras que carregava em seu avental, mas também trazia aos homens as doenças, a velhice a morte. Ela era também um espírito protetor dos rios e lagos, garantindo que eles não secariam. Ela controla os meses de inverno, trazendo o frio, as chuvas e a neve. Mas um de seus principais títulos é Rainha da Tempestade, pois com seu cajado ela trazia e controlava as tempestades, particularmente as nevascas e furacões. (“ Eu semeio o vento, na minha cidade / Vou pra rua e bebo a tempestade.” [Chico Buarque])
Cailleach é a guardiã do portal que leva à parte escura do ano, iniciada no Samhain e é invocada nos rituais de morte e transformação. (Morte é sempre transformação. Morre o velho para o novo se estabelecer) Nos mitos da troca de poder entre as faces da Deusa ela recebe o bastão branco dos meses de luz e o torna negro para os meses de trevas, devolvendo-o à Donzela no Imbolc. Em alguns mitos diz-se que Ela retorna à terra no Imbolc, tornando-se pedra para acordar somente no próximo Samhain.
Como Seu nome não aparece nos mitos escritos da Irlanda, mas apenas em histórias antigas e nomes de lugar, presume-se que Ela era uma divindade pré-celta, trazida pelos povos colonizadores das ilhas Britânicas, vindos do leste Europeu, possivelmente da Índia. (Olha Kali de novo aí) Ela era tão poderosa e amada que mesmo quando os recém chegados trouxeram suas divindades, como Brigit, Cailleach ainda continuou sendo lembrada.
Apesar de ser considerada uma Deusa Anciã, Ela é quase sempre representada com um rosto jovem, mostra de seu poder de se rejuvenescer constantemente. Ela possui um aspecto Donzela parecido com Diana, sendo a protetora dos animais selvagens contra caçadores. Ele protege principalmente o cervo e o lobo, assegurando bandos saudáveis. Há um mito antigo que conta que os caçadores oravam a Cailleach para saber onde encontrar os cervos e quantos matar. Ela os guiava para a aqueles que podiam ser mortos, desobedecê-la trazia sua fúria, em forma de ataques de alcatéias para a vila dos desobedientes.
Ela também possui um aspecto Mãe, sendo aquela a quem as mães pediam que curasse seus filhos das doenças do inverno. O Gato é um de seus animais sagrados. Em algumas lendas ela toma a forma de gato para testar o caráter das pessoas. Em sua forma humana, ela costumava ir de casa em casa no inverno pedindo abrigo e comida. Os que a acolhiam contavam com sua eterna bênção e proteção e os outros eram amaldiçoados e não atravessam o inverno incólumes. São também sagrados para ela o corvo e a gralha.
Seu rosto é azul (Desculpem eu disse que era verde) e seus cabelos sempre são representados soltos e brancos, escapando de seu manto e capuz. Ela carrega um caldeirão em uma das mãos e um cajado na outra. Seu cajado ou bastão lhe conferia o poder sobre o tempo, fazendo dela uma das Deusas mais importantes para a manutenção da vida no planeta. Ela é também uma Deusa associada à crua honestidade e à verdade, doa a quem doer. (O grifo é meu. Isso é um ideal, por isso encontrar de frente com Cailleach é tão importnate. Ela nos coloca com nossa verdade mesmo que não queiramos saber dela.)
Ela também aparece como uma mulher velha que pede ao herói que durma com ela, se o herói concorda em dormir com ela, ela se transforma em uma linda donzela.
O Livro de Lecam (cerca de 1400 E.C.) alega que Cailleach Beara era a Deusa da qual se originaram os povos da região de Kerry. Na Escócia ela representa a personificação do inverno, nasce velha no Samhain e fica cada vez mais jovem até tornar-se uma linda Donzela no Beltane.
O contato com esta Deusa nos ajuda a redescobrir a soberania sobre nossa própria vida, um tipo especial de poder e confiança. (É preciso encontrar Caileach!!) Cailleach, violenta como pode parecer, vive em todos nós. (Nossa sombra, nós mesmos.) Ela nos traz a sabedoria para deixar ir aquilo de que não mais precisamos e manter as sementes do que está para vir. Ela vive no limite entre a Vida e a Morte. (Heia!)
A Cailleach é uma das mais importantes e mais imponentes deidades dentro da mitologia das regiões gaélicas da Escócia. Mas ela é também uma figura complexa e inconstante, sendo por vezes mais adequado referimo-nos a ela como parte de um conjunto de divindades ou espíritos destrutivos denominados Na Cailleachan, também conhecidas como “As Bruxas da Tempestade”.
A palavra Cailleach significa “anciã” e deriva do Irlandês Antigo, Caillech, véu (em irlandês atual, caille), o que evidencia uma proximidade ou mesmo derivação do latim pallium, cujo significado também é véu. Essa possibilidade é corroborada pela tendência das línguas gaélicas de trocar o ‘p’ pelo ‘c’ em palavras estrangeiras.
No antigo poema irlandês, Aithbe dam Bés mora ou ‘O Lamento da Anciã de Beare’, uma figura que podemos facilmente identificar com a Cailleach fala:
…) sech am tróg, am sentainne.
Ní feraim cobra milis;
ní marbtar muilt dom banais;
is bec, is líath mo thrilis;
ní líach drochcaille tarais.
Ní olc lim
ce beith caille finn form chinn;
(…) Não sou apenas miserável, mas sou uma velha
Não falo palavras adocicadas,
carneiros não são abatidos
para o meu casamento,
meu cabelo é escasso e cinzento,
ter um pobre véu sobre ele não causa desgosto.
Ter um véu branco em minha cabeça
não me causa tristeza.
A origem da palavra Cailleach como “velada” pode ser um indício de sua associação com a imagem da freira. Na Irlanda antiga esse era um termo que trazia uma forte conotação de uma mulher que nunca se casou ou que se casou com Cristo, e com a ascensão do cristianismo as personagens mitológicas e deidades pagãs foram sendo transformadas e adaptadas para serem aceitas pela nova religião. Em contrapartida, em áreas mais remotas, a cultura gaélica preservou a figura da Cailleach como deusa e regente do inverno, e a associação dela com o véu é muito mais significativa em sua imagem originalmente pagã: a imagem de uma velha feiticeira. No folclore escocês, ela é retratada como uma mulher muito velha, enorme, com um só olho, penetrante e afiado como o gelo, a pele escura, azul, os dentes vermelhos como ferrugem, os cabelos brancos e um véu sobre eles. Todas suas roupas eram cinzentas e ela jamais era vista sem seu manto malhado sob os ombros.
A Cailleach é uma divindade associada às forças mais brutais e destrutivas da Natureza, especialmente às forças do Inverno e da tempestade. Seu titulo mais conhecido é Cailleach Bheur. Este epíteto nos dá algumas possibilidades de interpretação: a palavra bheur é o genitivo de beur, cujos significados são “pontiagudo, afiado” assim como “claro, limpo”. É também a palavra para pico ou local de grande altitude. Esses significados ligam-se diretamente aos aspectos invernais dessa divindade, às características do gelo, da neve e das tempestades. A Cailleach também é, dentro das sobrevivências culturais, a construtora das montanhas e colinas, conectando-a, assim, aos lugares altos.
Outra possibilidade da etimologia do nome Cailleach Bheur encontra-se no registro mais antigo sobre ela, o já citado Aithbe dam Bés mora, O Lamento da Anciã de Beare. Esse poema, datado, aproximadamente, do ano 800, mostra a grande influência e passagem da mitologia irlandesa para as regiões da Escócia com a instalação do reino de Dál Riada. O título Anciã de Beare é, em irlandês antigo, Caillech Bérri, um possível cognato de Cailleach Bheur.
Apesar de este ser seu nome mais difundido, ela é conhecida por muitas outras denominações em diferentes regiões. Na maior parte da Escócia, especialmente nas Highlands, ela é chamada Beira, Rainha do Inverno, enquanto que na lenda irlandesa, ela intitula-se Buí. Em algumas partes da Escócia é também chamada Mag Moullach e nas Lowlands de Gyre-Carline, sendo carline a palavra do Scots que corresponde a ‘mulher velha’. Na Ilha de Man é chamada de Caillagh ny Groamagh, Anciã Sombia, e Caillagh ny Gueshag, Anciã dos Feitiços, e é tida como um espirito da tempestade e do inverno, que aparece que no dia 1 de Fevereiro prenunciando como será o restante do ano. Um dia ensolarado denuncia que o ano será de má sorte. Na Escócia, a primeira colheita é dita como abençoada e a última amaldiçoada, recebendo o nome de a’chailleach. Outro nome interessante que ela recebe pelos habitantes da costa noroeste é Gentil Annie. Um apelido que pode ser sarcástico ou apaziguador, já que os pescadores atribuem a ela os ventos furiosos do começo da primavera.
Mas tradicionalmente a Cailleach não é apenas uma divindade destruidora. Como todas as deidades celtas, ela não possui um único aspecto ou função, mas uma multiplicidade. Sendo assim, a Cailleach é também uma deidade criadora. Tradicionalmente, ela é conhecida como sendo a mãe de todos os Deuses e Deusas, e também a responsável pela criação dos lagos, rios, montanhas e colinas. Uma das histórias antigas sobre a formação de alguns loch escoceses conta que Beira, Rainha do Inverno, tirava água todos os dias de uma fonte em Ben Cruachan, na região de Argyll. Todos os dias, ao nascer do sol, ela destampava a fonte e depois a tampava de novo quando o sol se punha. Um certo dia, por descuido, ela esqueceu-se de tampar a fonte e a água transbordou e jorrou, descendo pelas montanhas, rugindo como um mar furioso. E foi assim que veio a nascer o Loch Awe. Em outra ocasião, uma de suas empregadas, chamada Nessa, ficou responsável por destampar e tampar outra de suas fontes, localizada no condado de Inverness. No entanto, uma certa tarde, a moça de atrasou para cobrir a fonte e, quando ela aproximou-se, as águas saltaram em sua direção, fazendo-a correr por sua vida. Beira, sentada em Ben Nevis, a montanha que era seu trono, sentenciou: “Você negligenciou seu dever. Agora você correrá para sempre e nunca deixará a água.” A moça, então, transformou-se no Rio Ness e desembocou no meio de duas montanhas, formando assim o Lago Ness.
A criação das duas montanhas que rodeiam o Lago Ness também foi atribuída à Cailleach. Uma das razões pelas quais Beira construía as montanhas era para servir-lhe como degrau, por seu enorme tamanho. Outra razão era para servirem de casas para seus filhos gigantes, que eram chamados de Fooar, um possível cognato do irlandês Fomóiri. Os Fomóiri são uma tribo de Deuses usualmente ligados ao mar, mas existem também fontes onde são associados a torres de vidro, que podemos interpretar como uma metáfora para os icebergs. Alguns deles, como Indech, um de seus reis, são ditos como filhos da deusa Domnann, posteriormente chamada de Domnu, uma figura obscura e pouco citada no Lebor Gaballa Érenn, o manuscrito que conta a chegada dos deuses à Irlanda e um dos textos mais importantes da mitologia irlandesa. Embora não haja muitas evidências que digam ter sido De Domnann mãe de todos os Fomóri, a relação entre ela e a Cailleach reforça-se ao vermos ambas como divindades primordiais que regem as forças naturais mais selvagens e indomáveis.
O fato de ela receber o nome de Gentil Annie também nos permite fazer algumas associações interessantes. A Cailleach é conhecida como a mãe dos Deuses e Deusas. Uma idéia muito difundida é que, dentro da mitologia irlandesa, esse papel seria atribuído a Dana ou Danu, como deusa progenitora das divindades da tribo, os Tuatha Dé Dannan. No entanto, nos estudos dos textos irlandeses uma confusão costuma ser feita entre os nomes Dana e Ana. O nome Dana é uma especulação a partir do possessivo Dannan, não aparecendo como mãe dos deuses no Lebor Gaballa Érenn, nem em nenhum outro manuscrito. Por outro lado, em algumas versões, a figura que aparece como a mãe dos Deuses, é Annand, que o Lebor Gaballa Érenn aponta como sendo o nome da Mórrighan, já que An Mórrighan, de acordo com a maioria dos estudiosos, significa A Grande Rainha (do Irlandês antigo mor, ‘grande’ e ríogain, ‘rainha’), o que se encaixaria melhor como título, não como nome. O Lebor também indica como sendo dela as Dá Chích Anann, as Tetas de Ana, duas colinas redondas localizadas na província do Munster, o que a liga com as montanhas e colinas.
As características em comum entre a Cailleach e a Mórrighan são bastante fortes: a ligação com o tempo de morte, escassez, mas também com a força do nascimento. As figuras aproximam-se, inclusive, na descrição física, especialmente quando observamos o seguinte trecho do final da Batalha de Mag Rath:
“Sobre sua cabeça guincha
Uma bruxa magra, rapidamente pulando
Sobre a posição das armas e escudos;
Ela é a grisalha Mórrighan.”
Entretanto, em outras redações do Lebor, a deusa que é tida como mãe dos Deuses é Brigit, conhecida na Escócia como Brìde. Interessante notar que na mitologia escocesa, a maior parte das lendas relata Brìde e a Cailleach sempre em oposição. Enquanto a Cailleach rege o período escuro do ano, Brìde rege o verão e os dias claros. No entanto, algumas outras lendas as retratam como sendo a mesma.
O mito conta que ela nunca morria de velhice, pois todo começo de primavera ela bebia as águas mágicas da Fonte da Juventude nas Ilhas Verdes do Oeste. Algumas versões falam que ao beber dessa fonte, ela tornava-se uma jovem de cabelos loiros, bochechas rosadas e olhos azuis, vestindo o manto verde das pastagens e coroada com as mais diversas flores. Isso não explica apenas a possível identificação dela com Brìde, mas mostra, principalmente, a capacidade de regeneração dessa deidade e sua profunda ligação com os ciclos sazonais.
Nas regiões mais rurais da Escócia ela é celebrada em seu festival, o Latha na Cailliche, que ocorre por volta de 24 ou 25 de Fevereiro, visto como o dia em que seu reinado de inverno termina, dando lugar ao reinado de verão de Brìde.
FONTES:
CAMPBELL, J.F. Popular Tales of the West Highlands. Publ. em 1890.
CAMPBELL, J.G. The Gaelic Otherworld. Ed. Interlink Books, 2008.
CAREY, John. Transmutations of Immortality in the ‘The Lament of the Old Woman of Beare’. School of Celtic Studies: Dublin Institute for Advanced Studies. Artigo disponível em:
JONES, Noragh. Power of Raven, Wisdom of the Serpent. Ed. Lindisfarne Press, 1995.
MACKENZIE, D.A. Wonder Tales from Scottish Myth and Legend. Publ. Em 1917
SQUIRE, Charles. Mitos e Lendas Celtas. Ed. Nova Era, 2003.
Extraído de coilledharaich
Que sejam prósperos.
Raffi Souza.